Editora: Martins Fontes
Páginas: 222
Trata-se de um livro muito singelo, ponto. A história da
autora japonesa, Kazumi Yumoto pode ser chamada no mínimo, no mínimo, de bela,
porque contém personagens muito cativantes que nos fazem sempre querer mais
páginas, mais fatos, mais poesia. Sim! É uma obra que carrega um teor muito
excêntrico de poesia; que é rodeada de ideias nítidas e de mistérios sobre os
quais a nossa mente sempre filosofa. O que vem depois da morte? O que é morrer?
Qual nossa razão de existir?
Considero os japoneses muito sóbrios e introspectivos, e vejo
que se reflete na literatura da maioria deles. São samurais em busca da
perfeição de tinta e papel!
Basicamente a história é o relato de memória de um menino
chamado Kiyama. Ele nos conta as lembranças que tem da sua infância, junto dos
seus dois melhores amigos: Yamashita, o gordinho comilão e Kawabe, o esquisito
hiperativo. Ao término das férias de verão, os três resolvem espiar um velho da
vizinhança, que, segundo os rumores ouvidos por eles, está prestes a morrer; e
como nenhum deles ainda tinha visto uma pessoa recém-falecida, seria uma boa
experiência.
Dá para se divertir muito com os planos que montam para
observarem o velho sem serem vistos, o que muitas das vezes dá errado. Nenhum
movimento dentro da casa. Chegam a pensar, até certo ponto, que o velho morreu
em frente à tevê, mas deparam-se com o contrário. Aos
poucos o velho vai percebendo a aproximação dos três pestinhas que têm rondado
sua casa e, mesmo depois de algumas relutâncias, eles acabam por gerar um
vínculo natural, quase repentino, mas acima de tudo, muito bonito.
A casa e a vida do velho senhor, que estavam abandonadas,
passam a ganhar uma nova cara. Sua decrepitude se esvai: enerva-se a casa (cheia
de antigos escombros, vidros quebrados e lixo espalhado na grama) à mesma
medida que a saúde dele. Os meninos conseguem reformá-la devagarinho, uma
pintura ali, uma capinada aqui. Novinha em folha fica a residência e a
disposição do senhorzinho finalmente aparece, como não vinha há anos. Para
comemorar, o velho parte uma melancia, e aquele se torna um signo, um código, um
rito só deles, como bons e grandes amigos.
Sentindo o quintal muito vazio, o velho lança a proposta de
cultivar um jardim. Eles querem um bom resultado, e que seja rápido, para
deixar viva a casa com mais agilidade. Os meninos visitam uma casa de sementes
e descobrem que os amores-de-moça
seriam perfeitos para o quintal do velho. Assim o fazem: compram, plantam e
cuidam.
Digo que é emocionante “ver” as flores crescerem, mesmo que
seja pelas páginas do livro. Dentro da nossa cabeça nasce algo desconhecido e
que muda em segundos. Yumoto nos faz deslocar no tempo e enxergar um jardim
completo onde só há ainda sementes recém-plantadas. Um milésimo de segundos e
pensamos num pedúnculo; no outro segundo que sucede já temos os canteiros
cheios.
Resolvo me calar agora, para não ferir o clímax e nem
destruir a graça do resto de toda a história. Mas posso concluir dizendo: Os Amigos é um livro que vale a pena ser
lido por muitos motivos: talvez porque nos mostre os talentos e a profundeza
tão bela de suas personagens, como a incrível capacidade de Kawabe para
inventar histórias; a inoxidável habilidade de Yamashita com os cortes de
peixaria (negócio de família que pretende seguir); o “dom” que Kiyama tem para
escrever, ou a beleza dos fogos de artifício que o velho produz. Talvez porque
pode ser lido como uma história descompromissada, por fruição. Ou talvez,
ainda, porque o livro seja tão lindo que dê medo de chegar à última página.
Kazumi Yumoto deu o nome certo para sua obra: sinto que nos
tornamos grandes amigos; papel, letra e olho.
Por Leandro Lourenço
ola, Leandro.
ResponderExcluirLendo seu texto, me remeteu ao momento de visitação da casa do velho, aos meninos na escola, no asilo, na festa e em todos os outros lugares... e lágrimas vieram a meus olhos.
lembrei, pelo seu texto, de cada passagem, de cada crescimento dos meninos... e do velho.
esse livro foi FANTÁSTICO. tenho certeza que foi o melhor que já li, e reli por varias vezes.
muito, muito obrigado por trazer tão boas e doces lembranças a minha mente.
me despeço de vc, com uma parte de seu lindo texto... "o que me fez chorar."
"A casa e a vida do velho senhor, que estavam abandonadas, passam a ganhar uma nova cara. Sua decrepitude se esvai: enerva-se a casa (cheia de antigos escombros, vidros quebrados e lixo espalhado na grama) à mesma medida que a saúde dele. Os meninos conseguem reformá-la devagarinho, uma pintura ali, uma capinada aqui. Novinha em folha fica a residência e a disposição do senhorzinho finalmente aparece, como não vinha há anos. Para comemorar, o velho parte uma melancia, e aquele se torna um signo, um código, um rito só deles, como bons e grandes amigos."
Amo!
ResponderExcluirAmo!
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