quinta-feira, 14 de março de 2013

[Resenha] Os Pequeninos Borrowers

Capa nacional do livro
Autora: Mary Norton
Editora: Martins Fontes
Páginas: 809

Depois de alguns anos de atraso, surgiu no ocidente um filme do estúdio Ghibli, Karigurashi no Arrietty ou O Mundo dos Pequeninos, no Brasil. Naturalmente, decidi assistir e não me surpreendi quando me dei conta de que era um filme sensacional. Sensível e delicado como poucos outros. Tudo muito bem feito, desde os personagens até os cenários cuidadosamente detalhados. A história era sobre uma família de seres pequeninos que viviam tomando coisas emprestadas dos humanos grandões e, sobretudo, se escondendo a qualquer custo. Ser visto por um humano era o maior desastre que poderia acontecer à vida de um pequenino. Terminei o filme com uma dor enorme na alma, porque aqueles minutos não haviam sido o suficiente ao lado de Arrietty, Pod e Homily, como se alguém querido tivesse ido embora pra sempre, sem destino certo. Alguns dias depois da inevitável aceitação ter chegado, deparo-me com um livro. Sim, os pequenos têm um livro: Os Pequeninos Borrowers, de Mary Norton. Então, descubro que o livro tem 809 páginas e que a história dos pequeninos é composta por vários romances que originalmente foram publicados separadamente e que essa edição em português compreende a série completa. Meu deus! Uma ideia não parava de pipocar em minha cabeça. "O Filme do estúdio Ghibli fora baseado em apenas um dos livros!" Como não haveria de ser de outro jeito, comprei o mais rápido que pude e os pequeninos voltaram para mim.

A história é incrível e eu estava certo, o estúdio Ghibli usou apenas o primeiro livro para subsidiar seu filme. Ao ler, quando vi que quase todo o enredo do filme já havia ficado pra trás nas primeiras 100 páginas, minha barriga esfriava e uma ansiedade quase angustiante de descobrir o que as próximas mais de 700 páginas guardavam não me davam sossego. Então, as minhas aventuras com os pequeninos continuaram para além dos 94 minutos que o estúdio Ghibli me proporcionou.

O livro é dividido em seis partes. A primeira, chamada Os Borrowers, foi usada como base para o filme do Ghibli. Nela, a família de pequeninos, Pod, o valente e ponderado pai, Homily, a medrosa e comodista mãe e Arrietty, a destemida e revolucionária filha, vivem sob o assoalho de um velho casarão. A casa deles, o maior orgulho de Homily, é engenhosamente mobiliada e sua vida é tranquila e cômoda. Tudo o que precisam pra viver eles tomam emprestado da casa sobre eles. E essa rotina sempre lhes deu tudo o que precisavam, até que Arrietty deixa-se levar por seu espírito de aventura, que não é pequeno, e descobre que o mundo é muito maior do que eles imaginavam. Então, Arrietty acaba se envolvendo em uma série de problemas que começam a perturbar a antiga harmonia de sua rotina sob o assoalho. Toda a confusão culmina na necessidade de os pequeninos se mudarem e isso, sobretudo para Homily, é algo assombroso. Sem outra saída, eles acabam indo. Abandonam sua casa, os móveis que Homily tanto amava e todo o conforto que tinham. Assim, eles partem do casarão para o terreno ao redor dele.

A segunda parte do livro, chamada Os Borrowers na Terra, conta a primeira aventura dos pequeninos depois que eles fogem de sua casa sob o assoalho. As coisas não são fáceis para eles depois dessa mudança. Eles precisam se adaptar à vida no campo, sem seus antigos confortos e a segurança que tinham. Para Homily, tudo aquilo parece o apocalipse, enquanto para Arrietty, sua vida nunca fora tão emocionante. Eles acabam por construir sua casa em uma bota velha e aprendem a viver segundo o que a natureza tem para lhes oferecer. É nessa época que eles conhecem Spiller, um pequenino selvagem e arisco, que vive fazendo aparições surpresas para ajudá-los. A terceira parte, Os Borrowers na Água, narra as aventuras da família borrower sobre um rio. Sim, eles são capazes de navegar. Primeiro em uma chaleira velha e, por fim, em uma moita de galhos no meio de um rio. Para quem imaginava que a vida fora do assoalho seria impossível, até que essa família de pequeninos está se saindo muito bem. Na quarta parte, Os Borrowers no Ar, os pequeninos acabam por conseguirem voar e se envolvem, talvez, na maior enrascada de suas pequenas vidas. Na última parte da saga dos Borrowers, Os Borrowers em Apuros, parece que a família conseguiu encontrar um novo lugar onde se estabelecer, mas antigos problemas continuam perseguindo-os. A última parte do livro trata-se de um conto, Pobre Inocente, que é uma espécie de extra e não acrescenta informações sobre Arrietty e sua família.

É impossível não se maravilhar com o nível de detalhes do livro. Mary Norton descreve, com todo o cuidado, o cotidiano e todos os aparatos dos pequeninos. E eles, por si só, já são fascinantes. O livro nos mostra como os pequeninos reutilizam as coisas que tomam emprestadas. Botões, dedais, alfinetes, tampinhas, agulhas e uma gama enorme de coisas que nós humanos perdemos o tempo todo e nunca nos perguntamos onde diabos iam parar. Elas estão possivelmente na casa de algum pequenino, servindo como copos, talhares, espadas, xícaras, panelas ou qualquer outra coisa necessária para incrementar suas vidas. Com intuito perfeitamente compreensível, há trechos bastante descritivos em todo o livro. São trechos essenciais para a composição da história, que não seria a mesma se o universo dos pequenos não fosse esmiuçado com tantos detalhes. Inclusive, parte da diversão da leitura vem exatamente da curiosidade de descobrir como a vida dos pequeninos é, como eles são capazes de sobreviver apenas do que perdemos ou do que inocentemente nos tomam. A escrita de Mary Norton sustenta muito bem a narrativa e é capaz de nos enlaçar em um turbilhão de entusiasmo incomum. A vida dos borrowers é tão simples, tão pequena que nos faz querer encolher. Seus problemas são tão grandes e simples, suas necessidades tão ínfimas e instigantes, que a vida de gente grande parece perder um pouco a graça.

Quando lemos as últimas páginas do livro, encontramos uma inevitável amargura. Sim, logo depois da última página, já começamos a sentir saudade de nossos queridos pequeninos. E até hoje não encontrei algo que fosse tão próximo do nosso mundo e ao mesmo tempo compreendesse um mundo tão fantástico e perfeitamente escondido sob nossos narizes. Penso em um imperturbável paradoxo. A grandiosidade dos pequeninos e o quanto eles são capazes de serem maiores do que nós, suas vidas são maiores, mas mais simples e inocentes do que as nossas e isso faz com que sejamos menores, pequeninos num mundo de preocupações, desejos e intrigas assustadoramente gigantes.

Arrietty no filme do estúdio Ghibli

Por Fillipe Gontijo

2 comentários:

  1. Queria dizer que tambem fiquei com "dor na alma" ao assitir o filme,isso geralmente acontece quando assisto uma animação do estúdio ghibli. Eu vi o filme "O mundo dos pequeninos" faz pouco tempo, mas já conhecia a história pela série de tv "Os pequeninos borrowers" produzida pela BBC e que passou no Brasil pela tv cultura na década de 90; quando era criança adorava essa série. Vou ler o livro e "entrar" nesse incrível universo dos pequeninos.

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  2. Voce descreveu exatamente o que aconteceu comigo....parece até que fui eu quem escreveu esse texto.

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